"Ao longo de mais ou menos 12 anos, as crianças, por assim dizer, se integram em nossa cultura e, entre outras coisas, elas aprendem que há dois campos nos quais importa se destacar para chegar à felicidade: as relações amorosas/sexuais e o poder (ou melhor, a potência) no campo produtivo, financeiro ou social.
Em outras palavras, elas aprendem que há duas qualidades subjetivas que são cruciais para se fazer valer em nossa tribo: é necessário ser desejável e invejável.
Enfim, esse aprendizado mínimo está solidamente assimilado. Seus corpos, que se tornaram desejantes e desejáveis, poderiam lhes permitir amar, copular e gozar, assim como se reproduzir. Suas forças poderiam assumir qualquer tarefa de trabalho e começar a levá-los na direção de invejáveis sucessos sociais. Ora, logo nesse instante, lhes é comunicado que não está bem na hora ainda.
Em outras palavras, há um sujeito capaz, instruído e treinado por mil caminhos- pela escola, pelos pais, pela mídia- para adotar os ideais da comunidade. Ele se torna um adolescente quando, apesar de seu corpo e seu espírito estarem prontos, não é reconhecido como adulto. Aprende que, por volta de mais dez anos, ficará sob a tutela dos adultos, preparando-se para o sexo, o amor e o trabalho, sem produzir, ganhar ou amar: ou então produzindo, ganhando e amando, só que marginalmente.
Uma vez transmitidos os valores sociais mais básicos, há um tempo de suspensão entre a chegada à maturação dos corpos e a autorização de realizar os ditos valores. Essa autorização é postergada. E o tempo da suspensão é a adolescência.
Esse fenômeno é novo, quase especificamente contemporâneo. É com a modernidade tardia que essa moratória se instaura, se prolonga e se torna enfim mais uma idade da vida."
Para saber mais: A adolescência - Contardo Calligaris (p.14,15 e 16)