A "juventude" é apenas uma palavra

Trechos de uma entrevista interessantíssima concedida por Pierre Bourdieu.

"O reflexo profissional do sociólogo é lembrar que as divisões entre as idades são arbitrárias. É o paradoxo de Pareto dizendo que não se sabe em que idade começa a velhice, como não se sabe onde começa a riqueza. De fato, a fronteira entre a juventude e a velhice é um objeto de disputas em todas as sociedades." (p.01)

"A representação ideológica da divisão entre jovens evelhos concede aos mais jovens coisas que fazem com que, em contrapartida, eles deixem muitas outras coisas aos mais velhos. (...) Esta estrutura, que é reencontrada em outros lugares (por exemplo, na relação entre os sexos) lembra que na divisão lógica entre os jovens e os velhos, trata-se do poder, da divisão (nosentido de repartição) dos poderes. As classificações por idade (más também por sexo, ou, é claro, por classe...) acabam sempre por impor limites e produzir uma ordem onde cada um deve se manter em relação à qual cada um deve se manter em seu lugar." (p.01)

"O que quero lembrar é simplesmente que a juventude e a velhicenão são dados, mas construídos socialmente na luta entre os jovens e os velhos. As relações entre a idade social e a idade biológica são muito complexas." (p.02)

"Cada campo, como mostrei a propósito da moda ou da produção artística e literária, possui suas leis específicas de envelhecimento para saber como se recortam gerações é preciso conhecer as leis específicas;funcionamento do campo, os objetos de;luta e as divisões operadas por esta luta ("nouvelle vague","novo romance", "novos filósofos", "novos juízes",etc.). Isto é muito banal, mas mostra que a idade é um dado biológico socialmente manipulado e manipulável e que o fato de falar dos jovens como se fossem uma unidade social, um grupo constituído, dotado de interesses comuns, e se relacionar estes interesses a uma idade definida biologicamente já constitui uma manipulação evidente." (p.02)

In: BOURDIEU, Pierre. 1983. Questões de sociologia. Rio de Janeiro: Marco Zero. P. 112-121.